Alexey Dodsworth Carvalho Magnavita, conta pra gente o q pensa, muito! PARTE 1

PEGANDO EMPRESTADO da   Wikipédia e acrescendo um tiquinho: " Alexey Dodsworth Magnavita de Carvalho, também conhecido apenas como Alexey Dodsworth, é um escritor e roteirista de histórias em quadrinhos de ficção científica e fantasia, filósofo e acadêmico dedicado a pesquisas sobre futurismo e transumanismo", amante e praticante da astronomia  e também influencer de sucesso nas redes sociais .
Currículo de peso, nosso entrevistado  concedeu uma entrevista q faz jus ao ser multifacetado e brilhante q és ! 
Confira:  



# Que cidade nasceu, qual o Estado?

Nasci em Salvador, na Bahia, no ano de 1971.
# Cresceu ali ou se mudou cedo pra outra cidade ?
  • Sempre vivi em Salvador. Viajava bastante, geralmente para o Rio de Janeiro, onde boa parte de minha família materna reside. Me mudei para São Paulo em 2005 e morei em Veneza por três anos, durante meu curso de doutorado.
# Na sua infância e adolescência, conviveu num ambiente mais pra sadio e tolerante ou presenciou muito  racismo, homofobia, sexismo e afins?
Eu vivia em um ambiente bastante sadio e respeitoso, mas tenho consciência de que era uma bolha, um contexto muito particular. Cresci muito ligado ao lado materno da família, que é italiano. Morei a vida inteira em um prédio construído por esse lado da família, e em todos os apartamentos só moravam parentes, era uma família imensa, eu devo ter mais de cinquenta primos, claro que vai ter de tudo. Eu tive dois tios-avós homossexuais, então homofobia não era um grande problema em meu contexto, mas sei que nem sempre foi assim. Até onde sei, antes de eu nascer, nos anos 50, havia bastante homofobia mesmo dentro de meu núcleo familiar italiano. Um primo de minha mãe me contou horrores sobre a adolescência dele. Isso foi mudando ao longo dos anos sobretudo graças aos meus dois tios-avós, que sabiam se impor. Ou seja, eu tive a sorte de nascer em um contexto no qual o respeito havia sido exigido e conquistado por quem veio antes de mim. A ironia da vida é que os meus poucos parentes homofóbicos tiveram netos gays e transexuais, a quem amam muito. Deve ter sido um choque pra eles, mas eu sei que eles mudaram a visão que tinham das coisas. bisavô fez questão que as filhas estudassem, coisa que não era muito comum na época.
Todas as minhas tias-avós se formaram e foram mulheres muito poderosas nas áreas delas. Lembro delas como mulheres fortes, inteligentes, trabalhadoras. Todas já morreram, mas tive o privilégio de conhecer e conviver com cada uma delas. Não testemunhei mulheres da família sendo discriminadas por serem mulheres dentro do contexto familiar, mas não tenho como afirmar que nunca tenha ocorrido. Se acontecia, não era algo do tipo que eu via ocorrer em outras famílias. O que eu testemunhei muito na infância e adolescência foi violência física contra mulheres. Acontecia em quase toda família. Na minha família materna não rolava, que eu soubesse, mas na paterna eu sei que sim.
# Morou  em Salvador, a capital de Estado  mais negra do Brasil, vc e sua familia de maneira geral convivia bem com os negros e nem se tocava pra questão racial ou foi diferente?
A questão do racismo em Salvador era algo tão naturalizado nos anos 70 e 80 que coisas horrorosas aconteciam e pareciam normais. Havia desde lances sutis, como o fato de as propagandas da época raramente mostrarem negros. Você andava por Salvador, e os cartazes publicitários mostravam pessoas brancas, às vezes até loiras dos olhos azuis. Meus colegas negros de escola não podiam usar o elevador social dos prédios quando íamos visitar coleguinhas. Tinham que usar o elevador de serviço. Nós éramos crianças, e não víamos nada de errado nisso, chegávamos a apostar corrida nos elevadores, era tudo naturalizado. Isso não acontecia no meu prédio, mas ocorria bastante nos outros. Eu só fui me tocar de que havia algo diferente quando já era adolescente. Na época, mesmo sem política de cotas, os padres e freiras das escolas onde estudei destinavam vagas gratuitas para pessoas negras. Mas era aquela coisa: uma ou duas pessoas negras em uma sala com maioria de pele branca. Havia o desejo de incluir, mas faltava uma pedagogia antirracista, de modo que as crianças reproduziam as coisas horríveis que viam e ouviam de seus pais. Minha família italiana era majoritariamente antirracista. As pessoas mais próximas a mim recriminavam abertamente qualquer postura racista. Mas eu bem me lembro de um ou outro parente que me dizia, quando eu era criança, para não andar muito com determinado colega negro porque eu iria “pegar cheiro ruim”. Eu não entendia nada, já que eu não sentia nenhum cheiro anormal. Na verdade, quem me dava esses conselhos é que tinha cheiros nada agradáveis e hábitos de higiene não muito bons. Há algo de projetivo no preconceito: atribui-se como demérito do outro o que na verdade é a própria pessoa que traz em si. Isso acontece com pessoas que acusam homossexuais de serem pervertidos. Volta e meia explodem escândalos sexuais bizarros envolvendo moralistas. E o que dizer dos anticorrupção que são pegos em flagrante fazendo um monte de coisa errada? A forma mais eficiente de desviar a atenção de si é apontar o dedo pros outros.
# Na  infância e adolescência, estudou em escola pública ou particular? Quais os nomes das escolas? Havia diversidade racial, socioeconômica, religiosa, ideológica em todas, algumas ou nenhuma?
Sempre estudei em escolas particulares. Primário e ginásio no Instituto Nossa Senhora da Assunção, uma escola de freiras. Já o colegial, atual ensino médio, cursei no Colégio Antônio Vieira. No primeiro caso, havia diversidade socioeconômica, pois não era uma escola especialmente cara. Havia diversidade racial, embora a maioria tivesse a pele clara. Já no Vieira, a franca maioria era de classe média e média-alta, mas bem lembro que havia uma política por parte dos padres de oferecer bolsas integrais para filhos dos funcionários, o que garantia a presença negra, pois na época era muito raro que uma família negra pudesse pagar o Vieira. Enquanto no colégio de freiras havia pouca preparação pedagógica antirracista, no Vieira os padres eram mais preocupados comisso e bastante rígidos com ocorrências do gênero. Diversidade religiosa era impensável, eram colégios católicos, mas o Vieira não obrigava ninguém a práticas cristãs e estimulava o livre-pensamento. Eu adorava o Vieira. Até hoje mantenho contato com meus colegas, e fico feliz em ver como são pessoas esclarecidas, empenhadas em melhorar o mundo.
# Na adolescência já se preocupava com assuntos como política, racismo, orientação sexual?Honestamente, eu tinha zero preocupações com isso. Eu tive uma adolescência típica dos anos 80: só queria jogar videogame, ler, essas coisas. Questões de orientação sexual só vieram me chamar a atenção lá pelos dezoito anos. Era outra época. Com dezesseis anos, meus amigos mal falavam em sexo. A gente sabia que existia, alguns chegaram ater experiências nessa idade, mas não era o tema predominante.
  • Política, então, era outro planeta. Eu tive um tio paterno que foi preso pela ditadura militar por envolvimento com o Partido Comunista em 1976 e torturado por Ustra. Lembro de ter ido visitá-lo na prisão, mas eu não entendia nada do que estava acontecendo. Só lembro de achar divertida a ideia de visitar um tio na prisão, era como se tudo fosse um jogo. Eu fui uma criança muito ingênua e um adolescente muito nerd que vivia em um mundo de livros de ciências e de ficção fantástica. Só fui acordar pra vida depois dos vinte anos.
  • Minha adolescência se passou durante a ditadura militar, que em nada incomodou aminha família materna, predominantemente católica. Mas eu votei pra presidente nas eleições diretas de Lula contra Collor, e acho que foi aí que me toquei para a existência da política. Lembro bem de achar inacreditável que tanta gente se encantasse com Fernando Collor de Mello, a quem eu julgava um embuste marqueteiro desde a primeira vez que nele bati os olhos. Votei em Lula até ele ganhar, décadas depois. Sei que a maioria de meus tios-avós maternos também votou em Lula, o que podia soar estranho na época, vindo de família italiana, cristã e de classe média-alta. Mas quando você entende o tipo de cristianismo “raiz” deles, não é difícil de entender o fato de que estavam do lado dos mais pobres. Minha tia Gina sustentava sozinha um orfanato inteiro, com o dinheiro dela. Meu tio e padrinho Pasqualino construiu, com recursos próprios, uma instituição que dá aulas para a população carente da Ilha de Itaparica. Eles sempre foram ligados em causas sociais, sempre foram pessoas políticas no sentido amplo do termo: gente que faz acontecer. Jamais se alinharam com a extrema-direita, embora meu bisavô fosse amigo de Antônio Carlos Magalhães (a quem eu nem chamaria de “extrema-direita”)
#Quais  matérias mais gostava na infância e adolescência?
No ensino médio, sem dúvida, de literatura, história e filosofia. Durante o ginásio, eu amava ciências. Eu era um nerd da química, e tinha certeza de que seria químico. Eu tive aula de filosofia no ensino médio, e isso fez uma diferença e tanto. Meu primeiro professor foi Carlos Linhares. Anos depois, por conta da genealogia documental, descobrimos que somos primos pela minha parte paterna: eu e ele temos os mesmos heptavós. Isso provavelmente também se confirmaria pela genealogia genética, mas Carlos ainda não fez o teste. Curiosamente, depois dos 30 passei a me apaixonar por matemática e física. Eu não era exatamente péssimo nessas matérias, mas não gostava de estudá-las. Hoje em dia, faço pós-graduação em astrofísica e adoro os exercícios e projetos que envolvem cálculos. 

# Algum(a) professor(a) te marcou profundamente na infância e adolescência? Qual matéria ensinava? Quais seus nomes? 
No ginásio, a professora Telma (ciências) foi marcante. No colegial, lembro que eu matava aula para assistir novamente as aulas de filosofia de Carlos Linhares. E as aulas de Nieta, de história, não eram aulas. Eram espetáculos. Dilza Coelho, de redação, foi outra professora marcante que estimulou muito o meu gosto por literatura e escrita.

#Qual 1º curso universitário fez? Conte- nos um pouco acerca dasoutras graduações com os nomes de instituições e as cidades, nelas havia diversidades na forma da pergunta anterior?
Eu fiz universidade bem tarde, já tinha mais de trinta anos. Apesar de ter começado tarde, fui bem-sucedido muito rápido. Eu estava no primeiro ano de graduação em Filosofia quando fui selecionado para um evento argentino que só selecionava pós-graduandos, e emplaquei alguns artigos que foram capa da revista Filosofia, Ciência e Vida. Eles abriram exceção para artigos de alguém que ainda era estudante de graduação. Antes disso, a vida acadêmica não me interessava muito. Cursei Filosofia na Universidade São Judas Tadeu, em São Paulo. Instituição particular, mas eu ganhei bolsa integral por conta da nota do vestibular. Apesar de católica, o que não faltava nessa universidade eram minorias, lembro de uma moça transexual que tinha o no mesocial respeitado quando isso nem era lei. Depois fiz mestrado em Filosofia na USP e doutorado na Universidade Ca’ Foscari de Veneza, onde ganhei uma bolsa Erasmus Mundus. A bolsa Erasmus Mundus, aliás, é uma das maiores estimuladoras de diversidade que existem, pois não se restringe a cidadãos europeus e promove a mobilidade dos estudantes, permitindo que eles estudem em outros países. Cheguei a ser aprovado na primeira turma de Astrofísica em 2009, na USP, mas abandonei em 2011,quando entendi que não queria ser astrofísico. Eu gosto de alguns temas de astrofísica, gosto de ensino e de astrobiologia, e daí voltei pro Instituto de Astronomia, mas não como aluno de graduação. Estou cursando nova pós-graduação em ensino de Astronomia, que é o que me interessa. A ironia é que, cursando a pós-graduação em ensino, voltei a me apaixonar por astrofísica, cálculos, coleta de dados.

# Tem alguma religião? Se sim, conte um pouco de como é ser cientista, filósofo e ao mesmo tempo professar sua fé: 
Não tenho religião alguma. Me defino como ateu, no sentido clássico da palavra: eu não acredito na existência de um Deus pessoal que atenda às minhas preces ou se preocupe com o que faço na cama. É comum, porém, que as pessoas confundam o fato de que o ateu não acredita na existência divina com a ideia de que nós estamos afirmando que Deus não existe. Eu não tenho como saber disso. É só uma aposta: eu aposto que não existe. Mas digamos que exista. E se Deus existir? Está ótimo, nenhum grande drama quanto a isso. É apenas uma questão que não me preocupa, não faz a menor diferença na minha vida. Eu não preciso que exista um Deus para que eu pratique o bem ou viva corretamente. Quem faz o certo só porque tem medo da punição divina não é exatamente uma pessoa boa, é só alguém que está com medo do inferno. 
Eu vejo as pessoas agradecendo a Deus no Facebook por terem conseguido suas cidadanias italianas e portuguesas e penso: “espere um momento, você acha mesmo que Deus está preocupado com quantas cidadanias você tem?”. Eu acho um pensamento infantil e até egoísta. Tantas pessoas se lascando sem conseguir ser nem mesmo cidadãs brasileiras, tendo seus direitos básicos aviltados, e Deus parou tudo para te dar um passaporte vermelho? Eu não comento nada, mas se religioso eu fosse, ficaria ofendido. Eu tenho um amigo padre, italiano, que acha tudo isso pura heresia. Ele diz que a Deus nós agradecemos por nossa existência. O resto é tudo por mérito, demérito ou sorte nossa. É engraçado que eu, como ateu que sou, concorde tanto com esse padre.Mas não acho nada estranho que alguém seja cientista e tenha fé. Não vejo incompatibilidade. Eu conheço astrofísicos ateus, cristãos e praticantes do candomblé. Nós somos uma espécie que gosta de ritos. Eu sou ateu e adoro visitar igrejas, templos de religiões diferentes, e quase nunca perco uma festa de Yemanjá. Se as religiões não tentam impor seus estilos de vida pra todo mundo, elas não me incomodam. Quem me incomoda não são as religiões, são alguns de seus praticantes. 

#Começou a trabalhar com q idade, o q fazia? e hoje?
Comecei a trabalhar muito cedo. A história é divertida. Quando eu tinha doze anos, eu adorava Carl Sagan por conta do seriado “Cosmos”, e decidi estudar astronomia. Pedi a meu pai que me comprasse livros sobre o assunto. Ele procurou em todas as livrarias, mas nada encontrou, e me trouxe livros... de astrologia. Eu li tudo, achei esquisito, percebi que não era sobre aquilo que Carl Sagan falava, mas gostei do assunto e aprendia fazer os mapas astrais. Quando dei por mim, havia uma fila de adultos com o triplo de minha idade querendo me pagar pra interpretar os mapas deles. Com quinze anos, um francês chamado Jean-Claude Obry me chamou pra dar aula no Instituto de Crescimento Holístico. Na época, passei a ganhar mais do que meu pai e minha mãe juntos. A história é emblemática sob diversos sentidos. Primeiro, porque mostra como era difícil para um adolescente ler sobre ciência nos anos 80. Mesmo que ele quisesse, não havia material acessível. Não existia internet, e tudo o que nos restava eram livros e bibliotecas. Eu morava ao lado da principal biblioteca de Salvador, lembro de procurar por livros de astronomia, mas tudo o que eu encontrava era incompreensível para minha idade. Mas o que estava acessível? O que estava disponível? Esoterismo. A ironia é que o estudo do esoterismo me deu uma cultura geral bastante vasta, que vai de mitologia a psicologia, história etc. Há muita bobagem também. Muita gente acha estranho o fato de eu ter seguido uma carreira científica, que foi o que eu sempre quis, e ter um passado esotérico. Mas eu jamais, em momento algum, nem quando eu era um praticante ativo daquilo que as pessoas queriam de mim (astrologia), eu dizia que aquilo era ciência. Sempre divulguei a astrologia como um saber tradicional, como é um saber tradicional o jogo de búzios, e não há problema algum nisso. Nem tudo tem que ser ciência, mas na hora de tomada de decisões importantes é fundamental que nos guiemos por dados científicos.
Eu já joguei búzios com pais de santo em alguns momentos da vida por pura curiosidade, mas nenhum deles me disse para eu não me vacinar, ou algum absurdo do tipo. E, se dissesse, eu não seguiria. Assim como se alguém me perguntasse qual empregado deve ser contratado de acordo com a astrologia, eu responderia na lata: esse critério está errado. Isso me coloca numa posição que desagrada ambos os lados. Eu não levo saberes esotéricos como guias científicos para tomada de decisões importantes, o que desagrada os místicos. E não acho que essas coisas sejam a razão do mal no mundo, como defendem alguns céticos. Honestamente, acho que existem coisas piores e mais preocupantes para que a ciência se preocupe do que se alguém gosta de jogar búzios, tarô ou fazer mapa astral. A gente viu, durante a pandemia, como alguns médicos podem ser submissos a suas ideologias políticas a ponto de serem negacionistas da pandemia ou defensores de remédios inúteis. Há alguns que são até anti vacina! Quem você acha que causa dano ao mundo? A mãe de santo que joga búzios pra mim e me diz pra tomar um banho de folhas pra abrir meus caminhos, ou a médica que, revestida de sua autoridade, receita cloroquina pra combater covid? Com o tempo, eu migrei pra uma carreira mais acadêmica na área de filosofia e ética e me afastei de ambientes místicos. Fui assessor de projetos para a UNESCO, assessor especial no Ministério da Educação. Criei uma empresa que presta consultoria de pesquisa para projetos grandes. Atualmente, com a vida estabelecida e tranquila, faço só o que gosto: produzo literatura de ficção e roteiros para histórias em quadrinhos de fantasia e sci-fi e dou aula em cursos de curta duração. Não quis ser professor universitário. Gosto de estar livre para viajar, morar em outros lugares de tempos em tempos;
 # È casado e tem filhos? Quer falar algo acerca disso? 
Vivo em regime de união estável há quase quinze anos. Vamos nos casar formalmente por uma questão patrimonial, mas casados já somos de fato. Nem eu e nem ele temos a intenção de termos filhos biológicos, mas não é totalmente descartada a ideia de adotarmos crianças um dia (embora seja improvável). Eu realmente não gostaria de ter filhos biológicos. Há crianças demais no mundo que precisam de acolhimento, e qualquer vaidade no sentido de ver uma criança parecida comigo já foi suprida por meus irmãos e sobrinhos que tiveram filhos que são literalmente a minha cara. Além disso, para ter filho biológico eu precisaria de uma mulher que aceitasse gestá-lo porque deseja ser mãe biológica de uma criança com a minha participação. Eu não pagaria uma mulher para gerar um filho meu, admito que tenho um problema ético quanto a isso. Me sentiria explorando a vulnerabilidade financeira de uma mulher para atender a um capricho meu. Seria diferente se ela quisesse ser mãe com a minha colaboração.

 # VC está em vários grupos de genealogia tanto tradicional-documental qto genética, me parece q numa mistura de hobby, trabalho e algo onde vc pode se inspirar para seus escritos e estudos, na verdade, o q te atrai nos grupos de genealogia?
Meu interesse por genealogia é fundamentalmente histórico. A origem desse interesse tem endereço certo: meu bisavô italiano fez um diário que começa em 1898, quando ele tinha apenas 17 anos, e termina em 1972, quando ele declara meu nascimento. É um relato impressionante da história do Brasil e da Itália, repleto de nomes anônimos que foram os ancestrais dele e de várias pessoas. Durante um bom tempo, eu criei árvores genealógicas de famílias italianas, principalmente das que se estabeleceram na Bahia, e ajudava os descendentes a localizar documentos para a regularização da cidadania italiana. Já ganhei algum dinheiro como genealogista documental, ajudando pessoas a conseguirem a documentação para cidadania italiana, mas nunca foi fonte principal de renda. Eu sempre cobrei valores muito abaixo do mercado, e não foram poucas as veze sem que cobrei absolutamente nada. Não acho errado quem cobre valores mais altos,vale dizer. Cada um cobra o que quiser, paga quem pode. Ou, se não quiser pagar, pode pesquisar e achar tudo de graça. Depois, graças à internet, descobri que havia um grande estudo genealógico documental sobre minha família paterna, e fiquei impressionado com a riqueza de detalhes, documentos, fotografias. Foi quando descobri descender de Branca Dias, Brites Mendes, Vasco de Lucena e uma legião de sefarditas que colonizaram o Nordeste brasileiro. Como história sempre me interessou, estudei o assunto a fundo, comprei uma enormidade de livros, alguns extremamente raros, e terminei me especializando em linhagens sefarditas muito antes de isso tudo ter virado uma febre de corrida pela cidadania portuguesa. Escrevi muito laudo genealógico sefardita de graça, ou cobrando preços simbólicos. Nunca quis ganhar muito dinheiro com isso, não por uma questão moral, mas porque só me interessava pegar casos em que a pessoa claramente tinha o direito, mas não muito dinheiro. Quem tem grana, pode pagar caro alguns dos ótimos genealogistas documentais que existem. Eu não preciso ser mais um, ganho dinheiro com outras coisas.

#Quando e como descobriu os exames de DNA pra fins de ancestralidade e outros fins ?Qual empresa fez seu 1º exame?

Foi em 2016. Eu morava em Veneza, e o teste do 23andMe fazia muito sucesso entre meus amigos. Aproveitei que morava na Itália e comprei um kit. Entre 2016 e 2019, eu sempre levava vários kits para pessoas do Brasil que queriam se testar pela empresa, e depois levava de volta e despachava a partir de meu endereço italiano. 

# Que impacto teve ao v seus resultados de percentagens étnicas, algo inesperado outudo nos conformes? E qto aos matches, alguém te chamou a atenção, se sim, por q?
Foi interessante, mas não uma surpresa. Nada que eu já não soubesse por genealogia documental. Foi possível, por exemplo, confirmar que nem minha família italiana eratão italiana assim. Minha família é calabresa, e os próprios italianos chamam a Calábriade “Calábria Saudita”, ou seja, há muita influência árabe no sul italiano. Ironia: sou geneticamente mais europeu que meus tios-avós nascidos na Itália, pelo seguinte: a avó deles provavelmente era síria. Ela foi adotada, eu encontrei inclusive o documento onde consta que ela foi um bebê encontrado numa rua de uma cidadezinha chamava Belverede Marittimo. Nada no documento diz que ela não fosse italiana, mas duvido que fosse. Já havia muita migração norte-africana pra Itália na época, e acho que ela era filha de uma mulher persa. O DNA mitocondrial dos descendentes dela é tipicamente persa, e os netos nascidos na Itália são todos 25% africanos do norte. Eles todos são75% europeus e 25% africanos do Norte, sendo que a parte europeia tem muito DNA ibérico. 
Há uma piada na Itália sobre isso: eles dizem que o Sul da Itália é, na verdade, África do Norte. Estão certos, embora quem diga isso sejam algumas pessoas do Norte italiano em teor xenofóbico contra os sulistas. Outra coisa interessante foi entender o quanto há de loteria na genética. Eu quase não tenho DNA italiano e tenho muito ibérico. Minha irmã é meu oposto: tem muito italiano e pouco ibérico. Quanto a matches, a surpresa interessante foi descobrir que vários amigos meus eram meus parentes genéticos. Eu tenho alguns grandes amigos cujas correspondência de DNA comigo é de 0,5%. Isso não é pouca coisa. Graças ao cruzamento da genealogia genética com a documental, consegui identificar quem eram os nossos ancestrais em comum. São todos da parte paterna, ancestrais do Ceará, mais especificamente de Baturité. 

# Qual seu Gedmatch? Costuma usar essa plataforma tão famosa entre os amantes da gen genética?

Quase não uso. Volta e meia olho, só por curiosidade, e eventualmente alguém meescreve por conta de algum match, tentando entender qual o ancestral em comum. Meu Gedmatch é M960806.

# Qual  seu haplogrupo ydna? Foi surpresa? Pretende conhecer melhor com exames mais fundos?
  • Meu yDNA é J-M241. Foi surpresa, sim, já que esse haplogrupo é bem incomum entre usuários do 23andMe. É um haplogrupo muito comum entre judeus. Eu consegui rastrear a linhagem paterna até meu tetravô português Joaquim de Carvalho, mas a partir daí não consegui avançar ainda. Tenho pra mim que ele deve ter sido um dos muitos descendentes de judeus portugueses que viveram em cidadezinhas nos interiores profundos de Portugal. Talvez no futuro eu faça um YFull. 
  • # Num dos comentários em meu grupo de Gen Genética do Facebook, vc disse: “Meu DNA mitocondrial é C1, haplogrupo ameríndio. Veio de minha avó materna, evidentemente, e da mãe dela, aí é que está o problema: esta linhagem baiana de minha avó materna é um mistério.": 
  • a) pretende fazer um exame mais fundo pra obter melhores infos desse haplo?  Um dia, talvez. 
  • b. pela calculadora Jameslick deu pra detectar se é C1b como a maioria dos C brasileiros, mostrou a Claudio Bravi como é de práxis pra  quem vem com haplo mtdna amerindio
  • O próprio 23andMe já me informou que o haplogrupo é C1b.
  • c) De q lugar da Bahia era sua vó, pode falar acerca do “mistério”?
  • O nome de minha avó biológica era Maria José Alves de Oliveira. Não faço ideia de onde ela nasceu. Sei que viveu um tempo com meu avô italiano na fazenda da família em Itapebi, e que depois viveu na ilha de Itaparica. Quando ela ficou grávida, manifestou interesse em abortar, mas daí a mãe de meu avô pediu para ficar com acriança, e assim foi: minha mãe nasceu e foi imediatamente entregue para a avó paterna. Sua mãe de leite foi uma tia paterna. Um dos raros casos em que a criança é criada pelo pai e não pela mãe. Eu cheguei a conhecer minha avó materna biológica brevemente, era uma mulher muito bonita, evidente mistura de europeu com indígena e com zero vocação materna, o que é uma característica muito respeitável e avançada pra época. Ela jamais quis ser mãe, não deveria ser criticada por isso, e foi muito generosa em levar a gestação a cabo só pra dar um bebê para a ex-sogra. Dizem que era filha de um português que se chamava Antônio de Oliveira, mas não sei confirmar se isso é verdade. Ela morreu jovem, soubemos por uma carta enviada por outro filho dela com quem nunca conseguimos contato. Até outro dia, as pessoas diziam que teria morrido no Rio de Janeiro, mas mais recentemente me disseram que foi em Juiz de Fora. É tudo muito obscuro. Houve um match altíssimo que com certeza é do lado dela: um provável neto de uma irmã dela chamada Olga, que em tese morava em Ilhéus. Mas o rapaz não deu muita bola pra minha abordagem, e isso não me incomodou em nada. As prioridades dele não têm que ser as minhas. Eu fico realmente espantado em como algumas pessoas ficam furiosas quando se deparam com gente cujas prioridades não são as delas. Veja esse caso: eu adoraria bater um papo comesse rapaz, saber da história da família dele e tentar identificar como essa história se cruza com a história de minha avó biológica. Ele não demonstrou interesse nisso, e não tem a menor obrigação de transformar algo que me interessa num interesse dele. Vida que segue.
  • Além disso, há também o fato de que eu tive uma avó muitíssimo presente, não tenho nenhuma carência de avó. Essa avó não era biológica, mas eu não dou a menor importância a isso, e pra mim “avó de verdade” é quem é avó de fato, não quem doou seus genes. Minha avó se chamava Nuccia, apelido de Elena (Elenuccia em italiano é algo como “Heleninha”).
  • Nuccia era uma italiana que foi dama de companhia de minha bisavó. Ou seja, Nuccia não era minha parenta de sangue, mas foi a minha avó efetivamente, pois foi a mulher que criou minha mãe e os filhos de minha mãe. Morreu com mais de 90 anos. Gostaria, claro, de conhecer mais sobre minha avó biológica, principalmente porque através dela eu posso eventualmente rastrear o grupo indígena que me deu origem, mas isso é mais uma curiosidade intelectual: uma curiosidade sobreo haplogrupo C1b, não um “desejo de conhecer minha verdadeira história”, até porque eu sei a minha verdadeira história: eu sou neto de Nuccia, neto de uma mulher virgem que nunca pariu uma criança. Ela era minha avó de fato, não Maria José, que era só avó biológica. Em minha escala de valores, o afeto se sobrepõe largamente à biologia. Sei que há quem sinta de modo diverso, respeito isso até porque os sentimentos alheios não são da minha conta, mas acho um delírio quando alguém tenta me convencer que aminha avó “de verdade” foi uma mulher com quem mal tive contato, sendo que ela mesma pouco fez questão de ter contato, em detrimento daquela que dedicou a vida a criar minha mãe e a mim .
Em Breve a parte 2!





Comentários

  1. Uau, que saga incrível! Tem o mesmo Y-DNA que eu, sou J-M241 também.

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  2. Sim, o M241 contém linhagens sefarditas diversas, até então eu só conhecia ashkenazitas e turco-marroquinas.

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